A realidade dos magistrados brasileiros tem sido duramente afetada pelo adoecimento mental, é o que mostra um levantamento inédito feito pelo “Perfil da Magistratura Latino Americana” com juízes da América Latina que relata que um a cada três juízes brasileiros toma regularmente remédios para controle de estresse, ansiedade ou outra enfermidade relacionada à atividade jurisdicional. São diversos fatores que levam essa situação: a alta responsabilidade do cargo; submissão a uma carga de trabalho extenuante e cada vez mais crescente; falta de apoio estrutural condizente com a demanda de trabalho que recebe; pressão por celeridade na decisão dos processos, dentre outros fatores que foram relatados por magistrados.

De acordo com o juiz da 16ª Vara de Família de Fortaleza, Dr. Cléber de Castro, que exerce a função há mais de 20 anos, a pesquisa condiz perfeitamente a realidade dos juízes no Estado do Ceará. “Muitos colegas tem relatado problemas de saúde que, a meu sentir, tem direta relação com o exercício do cargo. Antes, por exemplo, não era comum juízes pedirem aposentadoria por tempo de serviço. Hoje, colegas estão deixando a magistratura para se aposentarem quando ainda poderiam continuar no cargo por mais tempo. Outrossim, juízes mais jovens abandonam a carreira para exercerem outras profissões jurídicas de menor responsabilidade, menos atribulações e, por vezes, mais vantajosas em termos remuneratórios.”

A pesquisa também reforça que 51% dos juízes brasileiros necessitaram de tratamento psicológico ou psicanalítico desde que ingressaram na magistratura.

O juiz Cléber de Castro também reforça que, da maneira que está sendo atualmente, é bem difícil qualquer juiz chegar ao fim da carreira sem o comprometimento da saúde física ou mental e pontua ações que podem ser feitas para evitar essa problemática. “
Acredito que a primeira medida seria dotar as unidades judiciárias em termos de recursos humanos e fornecer uma estrutura adequada e proporcional às demandas que cada magistrado recebe. O Judiciário Cearense já vem corrigindo esse fator, mas ainda estamos distantes do ideal. Deveria haver também um programa de acompanhamento pessoal e humanizado ao magistrado por parte da Instituição. Seria fundamental fomentar no juiz o sentimento de pertencimento à Instituição, pois o magistrado efetivamente é membro dela. Infelizmente, nos tempos atuais, cada magistrado está isolado na sua própria unidade, responsável por ela e pelos resultados que ela venha a apresentar em termo de números, e nada mais. Há uma ênfase excessiva e exclusiva à produtividade, olvidando-se que esse fator, por si só, não garante a qualidade do trabalho e pode, muitas vezes, ser responsável pela tomada de decisões equivocadas e injustas.”, reforçou o magistrado.

O presidente da ACM, o juiz José Hercy Ponte de Alencar, observa a pesquisa com grande preocupação e também reforça que a Associação e demais instituições relacionadas à Justiça precisam estar ainda mais atentas e unidas para buscar soluções, a fim de evitar que ocorra esse tipo de situação. “É necessário enxergar todo o panorama do judiciário cearense e buscar entender todos os pormenores que estão resultando em sérios problemas de saúde mental e física dos magistrados, bem como em todos aqueles que trabalham com o acesso à Justiça. Essa é uma questão que ganhará ainda mais atenção da nossa Associação durante esse ano, porque acreditamos que para exercer um bom trabalho é necessário primeiro que nossos colegas estejam bem psicológico e fisicamente, afinal a saúde deve vir em primeiro lugar”, explicou o presidente.