Matéria do jornal O Povo, edição de 4 de maio, traz manifestação da Associação Cearense de Magistrados (ACM) sobre parecer da Procuradoria-Geral da República favorável à ADI, cuja iniciativa é da ACM, que questiona o uso de depósitos judiciais pelo Governo do Ceará.

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LEIS & TRIBUTOS
Para Janot, lei do CE pode configurar “confisco”

A declaração consta no parecer do procurador-geral em ação que tramita no Supremo

A lei do Ceará que permite que 70% dos depósitos judiciais dos quais o Estado não é parte sejam transferidos para a conta única do Tesouro é considerada inconstitucional pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. O parecer foi dado no último dia 27 na ação direta de inconstitucionalidade que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). O processo segue agora para análise da relatora, a ministra Rosa Weber.

“Destinar recursos de terceiros, depositados em conta à disposição do Judiciário, à revelia deles, para custeio de despesas ordinárias do Executivo e para pagamento de dívidas da Fazenda Pública estadual com outras pessoas, constitui apropriação do patrimônio alheio, com interferência na relação jurídica civil do depósito e no direito de propriedade dos titulares dos valores depositados, sob a forma de empréstimo compulsório velado”, declarou Janot.

Os depósitos judiciais são valores relacionados a processos judiciais em andamento que ficam depositadas em contas oficiais, sob a responsabilidade do Judiciário, para garantir que, ao final, as sentenças sejam cumpridas.

Porém, pela Lei 15.878 de 2015, 70% destes depósitos são transferidos ao caixa estadual para que sejam destinados à recomposição de fluxos de pagamento e do equilíbrio atuarial do fundo de previdência cearense, pagamento de despesas classificadas como investimentos e custeio da saúde pública.

No ano passado, a Associação dos Magistrados do Brasil e o Conselho Federal da OAB ingressaram na Justiça alegando a inconstitucionalidade desta lei. Por serem semelhantes, as ações foram apensadas em um único processo.

Em seu parecer, Rodrigo Janot destaca que o texto cearense não só contraria a competência privativa da União para legislar sobre Direito Civil e Processual e para instituir empréstimo compulsório, como também dispõem de maneira contrária às normas constitucionais e infraconstitucionais federais que regulam estas matérias.

Ele explica que é da própria natureza jurídica do depósito possibilitar ao depositante reaver de imediato a coisa, tão logo seja autorizado. Deste modo, uma lei estadual não poderia constituir óbice ao direito de levantamento imediato e incondicional do valor depositado.

“Além de indisponibilidade financeira, essa restituição poderá encontrar óbices ocasionais na Lei de Responsabilidade Fiscal. Nessa hipótese, a apropriação dos recursos configuraria, mais do que empréstimo compulsório, verdadeiro confisco”.

Para o procurador, a lei também invade competência do Conselho Monetário Nacional e do Banco Central para disciplinar a atuação de empresas financeiras, pois determina a criação de fundo de reserva destinado a garantir restituição e pagamento de depósitos judiciais e extrajudiciais.

 

DE R$ 1,2 BI
Governo usou R$ 180 mi

Dos R$ 1,2 bilhão que constam no Fundo de Depósitos Judiciais, em torno de R$ 180 milhões já tinham sido utilizados pelo Governo até dezembro, segundo o presidente da Associação Cearense dos Magistrados, Antônio Araújo. Para ele, a lei do Ceará pode gerar mais espera. “Corre o risco de a pessoa ganhar ação e, não tendo recursos suficientes no fundo, ter que entrar com nova ação”. O presidente da OAB-CE, Marcelo Mota, diz que o Banco Central já alertou sobre riscos de legislações estaduais tratarem de formas díspares sobre estes recursos.

O POVO entrou em contato com a Procuradoria Geral do Estado do Ceará, que não se manifestou até o fechamento desta página. A Secretaria da Fazenda também foi procurada, mas a assessoria de imprensa afirmou que o secretário Mauro Filho estava em reunião em Brasília.

No processo, a defesa sustenta que a lei não contraria norma federal, nem prevê a apropriação de valores pelo Executivo. Defende ainda a compatibilidade da norma com a Constituição e afirmou que “o sistema de depósitos judiciais cearense é ampla e permanentemente superavitário e não possui problema de solvabilidade”.
Fonte: O Povo – link 1 | link 2