Marcelo Maia, aprendendo como professor no Timor Leste
Funcionário do TJ-CE, Marcelo Maia lecionou por um ano administração pública a universitários timorenses da Universidade Nacional de Timor Leste (UNTL), a única instituição de ensino público superior do país
O Timor Leste, na Ásia, não é dos países mais atraentes do mundo. Talvez quase ninguém saiba ou tenha interesse em saber que se trata de uma ilha e que sua extensão territorial é menor do que Sergipe, o menor dos estados brasileiros. Também não chega a curiosidade de muitos que tem como idioma oficial o português e está independente há apenas dez anos.
Auxiliar um país pequeno e miserável após anos de guerras por independência não é desejo comum de muitas pessoas. Mas foi do funcionário do Tribunal de Justiça do Ceará (TJ-CE), Marcelo Maia, que se dispôs a abrir mão de sua rotina em Fortaleza e do convívio com familiares e amigos para contribuir com a formação política engatinhante do Timor Leste. Marcelo lecionou por um ano administração pública a universitários timorenses da Universidade Nacional de Timor Leste (UNTL), a única instituição de ensino público superior do país.
Marcelo, além de funcionário do TJ-CE, tem mestrado em administração pública e o ensino como atividade paralela. Ao saber de edital da Universidade Presbiteriana Mackenzie que selecionaria 34 profissionais de diversas áreas que falassem língua portuguesa para lecionar na UNTL, ele não pensou muito antes de se submeter ao processo seletivo e rumar para Díli, a capital timorense. O que Marcelo não sabia era que, além de ensinar, se aproximaria da miséria dos timorenses a ponto de não só contribuir com formação intelectual, mas também com auxílio humanitário. “Via de perto as necessidades dos meus alunos, que eram considerados a elite do país, mas que também passavam fome e se submetiam a rotinas pesadas de trabalho para obtenção de renda”. Ver tão de perto essa situação despertou em Marcelo sentimentos de compaixão e solidariedade. “Percebi que não podia me limitar a oferecê-los formação intelectual sobre política para que avançassem como país. Não se pode exigir engajamento social de quem está com fome e sede e não tem onde morar”.
O funcionário do TJ conta que via pelas ruas as marcas de um país arrasado pelas guerras por independência. “A miséria é gritante. Grande parte da população é miserável, vive em casas de lata e não tem o que comer. Há esgotos a céu aberto e muitos pedintes nas ruas”. O professor então tornou-se companheiro. Doou roupas, alimentos e água. “Muitas vezes meus alunos da tarde tinham almoçado só biscoitos recheados, que lá é muito barato. Eu via no semblante deles a fome”.
Marcelo relata que se sentia invadido por sentimentos de impotência e vontade de fazer mais. “Via que meus esforços resolviam problemas pontuais, mas não a situação deles como um todo”. No entanto, diz que sabia estar fazendo o que estava em seu alcance para auxiliar. O Marcelo que retornou após um ano de vida no Timor Leste não é o mesmo que abriu mão de sua vida aqui. Para ele, tomar a decisão não foi sacrificante, e não considera que tenha vivido tempos desconfortáveis durante a estadia. Mas a marca do retorno de Marcelo está na vontade de perpetuar o sentimento de auxílio aos necessitados. Para tanto, se engajou como voluntário em grupo de pessoas que têm ajudado os desabrigados da comunidade Nova Estiva, no bairro Serviluz, em Fortaleza. “Depois do Timor Leste me tornei mais solidário, mais altruísta. O sentimento de que tenho muito enquanto outros não têm nada aflorou mais forte em mim. Percebi que não dá para fazer vista grossa para necessidades alheias e que podemos ajudar com tudo o que dispomos”, diz Marcelo, que já pensa em poder ajudar outro país da mesma forma que auxiliou o Timor Leste.
Por quê
ENTENDA A NOTÍCIA
Após a independência da Indonésia, em 1992, houve por parte do governo timorense empenho em fortalecer o português como língua oficial como forma de promover maior visibilidade internacional da nação.
Números
12 horas a mais é a diferença de fuso-horário entre o Timor Leste e o Brasil
24 anos foi o período de ocupação da Indonésia no Timor, após deixar de ser colônia de Portugal
Serviço
Marcelo criou um blog para relatar sua experiência no Timor Leste:
www.marcelolar.blogspot.com.br
Saiba mais
O objetivo da UNTL com o convênio em que Marcelo participou era fortalecer o ensino em língua portuguesa do Timor Leste. O português é a língua oficial do país, fruto de ter sido colônia de Portugal até 1975.
No entanto, poucos timorenses tem fluência na língua. Isto porque durante 24 anos eles foram proibidos de falar português como uma das regras da ocupação do exército da Indonésia no país após ter deixado de ser colônia portuguesa.
Jornal O Povo, 17/01/2013
Leia aqui a matéria completa