O Tribunal de Justiça do Ceará passa por transformação e ganha celeridade na tarefa de julgar, deixando para trás a imagem da lentidão do Judiciário. Neste cenário, o desembargador Jucid Peixoto do Amaral se destaca. Julgou mais de 3 mil processos desde que chegou à Corte
O senhor chegou ao patamar recorde de julgar cerca de três mil processos desde sua chegada ao TJCE, em fevereiro de 2010. Como conseguiu isto?
Nos últimos três anos, o Tribunal tem dado condições física e de pessoal para os desembargadores que compõem esta Corte. São condições que vão desde número suficiente de funcionários, estrutura física a equipamentos. Isto é importante. Pois, por exemplo, eu estava acostumado até com a falta de papel e de pessoal no Primeiro Grau. Certamente, quando aqui cheguei, estranhei para melhor. Tudo isto faz com que tenhamos incentivo para executar o nosso imenso trabalho.
Trabalhando com seu gabinete sempre de portas abertas, Jucid Peixoto do Amaral proferiu, em 11 meses, mais de mil acórdãos de mérito. Em sua longa carreira, emitiu milhares de sentenças, principalmente, no Crime FOTO: NATASHA MOTA
Isto é importante para o crescimento do Judiciário?
Afirmo que os (desembargadores) que me antecederam aqui no Tribunal foram verdadeiros heróis, porque não tinham esta estrutura atual. E, além disso, não havia um número de desembargadores como o de hoje, o que ensejou um grande atraso na produção do julgamento dos processos. Então, esses fatores contribuíram para o acúmulo dos processos. Entendo que o Judiciário do Ceará, que foi apontado como um dos mais lentos do País, em breve, certamente, será um dos mais rápidos do Brasil nos julgamento em Segundo Grau, e espero que, quando forem oferecidas as mesmas condições aos juízes de Primeiro Grau, sem dúvidas, estes vão acompanhar o ritmo do Tribunal.
Em toda a sua carreira, o Sr. se destacou sempre pela celeridade no julgamento dos processos, então como conseguiu superar estas dificuldades no Primeiro Grau?
Eu entendo que o julgador moderno tem que ser mais inteligente que o legislador, e também mais gestor que julgador. Os magistrados, hoje, são, acima de tudo, gestores. O juiz e o desembargador hoje precisam ter dedicação exclusiva ao seu trabalho, tem que vestir a camisa do Judiciário. Aprendi que você precisa gostar do que está fazendo. O juiz precisa ser vocacionado. Fui defensor público, fui promotor e advogado durante sete anos, mas o que eu queria era a Magistratura. Assim, entendo que o juiz precisa dar tempo integral. Precisa ser o primeiro a chegar ao seu local de trabalho e, se possível, o último a sair. Precisa segurar o barco. Além disso, sou prático, evito sempre o formalismo.
O excesso de formalismo também emperra a Justiça?
Certamente. O excesso de formalismo torna-se um entrave. Precisamos ser mais informais. Outro detalhe que acho importante citar é que gosto de trabalhar de portas abertas. A porta do meu gabinete é aberta de oito às 18 horas, para as partes e para os advogados. Nenhuma parte chega aqui e sai sem falar comigo, se necessário.
Como foi sua chegada ao Tribunal de Justiça depois de vencer tantas dificuldades no Primeiro Grau?
No começo foi muito difícil, pois quando aqui cheguei nesta Corte logo peguei um acervo de quase três mil processos, todos para que fosse proferida sentença.
Como então foi iniciado o trabalho? O Sr. usou de sua experiência do Primeiro Grau nesta empreitada?
Eu entendo que o bom juiz tem que usar da sua experiência como advogado, como promotor, como juiz e professor. Então, usei de toda essa carga de experiência. Gosto de tudo muito organizado e também de planejamento. Montei um organograma e um fluxograma. Aqueles processos que, a priori, necessitavam de um andamento mais rápido, logo dei vistas ao Ministério Público, à Procuradoria Geral da Justiça e à Procuradoria Geral do Estado, para que os mesmos, depois, viessem para mim, para um julgamento com mais segurança.
Processos de difícil julgamento?
Sim. Para que se tenha uma ideia, cada acórdão desse tem de 40, 50 e até mais páginas. Aqui, no Cível, diferentemente do Crime, as decisões precisam ser bem mais fundamentadas. A fundamentação no Cível é bem maior que no Crime. É preciso examinar se não há nulidade de ofício. Aqui é diferente, por exemplo, da Justiça Federal. Aqui há centenas de diversificações nas ações, enquanto na Justiça Federal os julgamentos são restritos e podem ser julgados em pacotes, ou blocos. No Cível, cada caso é um caso. A reincidência de casos é muito pouca.
O que se pede mais no Cível?
A incidência maior é de questões envolvendo o Estado, como concursos, reintegração de policiais e recursos em concorrência pública. Mas há também um grande volume de questões de ordem política, demandas bancárias, recursos revisionais, casos de inadimplência, cobrança, falência, concordata. Tudo isto vem desaguar aqui. Outro grande problema que aqui chega para julgamento é o relativo a atendimento médico. Temos, por exemplo, caso de pessoas com câncer, que necessitam de atendimento especial ou de medicamentos e o Estado não quer fornecer. Então, a grande manda hoje, no Cível, é de fatos desta natureza, na área da Saúde, pedidos de ordem médica. Posso dar como exemplo o caso em que condenei, neste mês, um hospital de Juazeiro, que não atendeu a uma senhora idosa. Ela foi várias vezes ao hospital e não foi atendida, e este, então, foi condenado apagar indenização. Isto prova que estamos protegendo a sociedade.
Com estes exemplos, podemos dizer, então, que a Justiça está mais próxima da sociedade?
Com certeza. E a resposta está sendo imediata. Temos seguido a norma do CNJ (Conselho Nacional de Justiça) e da Presidência deste Tribunal de que, todas as medidas de urgência devem ser atendidas em dez dias. A resposta tem que ser dada em, no máximo, neste prazo. Aqui, no nosso gabinete, já estamos dando estas respostas em menos disso, cinco dias.
E há metas, neste sentido, que o Sr. estabeleceu para 2013?
Sim. Já estamos, inclusive, fazendo isto. Os casos de revisão são despachados em 48 horas. Casos de urgência, cinco dias. Extraoficialmente, já estamos fazendo isto, mas, oficialmente, esta é a meta para o nosso gabinete no próximo ano. Aqui havia, por exemplo, processos intocáveis, isto é, que demoravam muito. Estamos fazendo aqui um rolo compressor.
É verdade que ao chegar aqui o Sr. se deparou com um processo ainda da época da Segunda Guerra Mundial?
Eu prefiro exemplificar que peguei aqui um processo ainda da época em que eu era advogado e que estava aguardando o primeiro despacho, um processo de usucapião de mais de 30 anos. Um processo com mais de 30 anos para sair o primeiro despacho?! Então, isto não pode acontecer, daí que o Judiciário do Ceará era tido como um dos mais lentos do Brasil. Mas, quero ressaltar que esta nova dinâmica não é um trabalho individual, mas sim, de todos os desembargadores, que estão também atuando neste mesmo patamar, neste mesmo ritmo de trabalho. Este é o ritmo imposto pelo Tribunal. Todos estamos cumprindo esta determinação, não é uma coisa minha. Diferentemente do Primeiro Grau, onde o juiz decide monocraticamente, aqui, a grande maioria das decisões são de colegiado. Não posso dizer, eu fiz isto. Eu tenho que usar a expressão, fizemos isto. O trabalho do Tribunal é de equipe. Aqui é um colegiado, e isto que tem garantido o sucesso nas decisões da Corte.
Como foi sua mudança de juiz do Crime para desembargador na área Cível? Houve muito impacto nesta mudança?
Quando cheguei ao Tribunal, já era professor de Prática Forense Civil, na Universidade de Fortaleza (Unifor). Então, para mim não foi surpresa. E no Primeiro Grau também respondi por 34 varas, por varas do Cível, da Fazenda Pública e a das Execuções. Mas o fato é que no Crime você aparece mais, ele é uma vitrine. No Cível a gente trabalha no anonimato.
A morte do seu irmão (delegado de Polícia Civil Cid Júnior, assassinado em 2008) também contribuiu para que o Sr. deixasse a Justiça Criminal?
Foi um fator que me causou trauma. Preferi evitar o Crime, pois acho que a legislação penal no Brasil está de mal a pior. E este projeto de reforma do Código, que vem por aí, vem piorar ainda mais a situação, porque nenhum legislador no mundo poderá consertar, no Brasil atual, o nosso sistema penal se não alterar a Constituição. Ela engessou o legislador.
SAIBA MAIS
O desembargador Jucid Peixoto do Amaral chegou ao Tribunal de Justiça em fevereiro de 2010 e, naquela Corte, deu prosseguimento ao seu intrépido ritmo de trabalho. Depois de passar pela advocacia, Defensoria Pública e pelo próprio MP, Jucid seguiu a carreira do pai, Cid Peixoto do Amaral, e se tornou juiz. Dirigiu 34 varas, entre elas, a das Execuções Penais, mas se destacou no Crime. Recentemente, sua atuação no TJCE foi publicada com destaque no site do órgão. De janeiro a novembro deste ano, relatou mais de mil acórdãos de mérito, e, desde que ingressou no TJCE, há menos de três anos, julgou aproximadamente três mil processos. Com tanta celeridade nos julgamentos dos processos que estavam encalhados, o magistrado conseguiu literalmente ´limpar´ as estantes onde os feitos estavam ´mofando´ anos a fio. Como meta para 2013, estabeleceu que em seu gabinete, todas as ações recebidas, a partir de março próximo, serão despachadas ou colocadas em pauta de julgamento em , no máximo, dez dias.