Levantamentos realizados logo após a eleição de 7 de outubro revelam que 157 candidatos a prefeito no País renunciaram na véspera da escolha e foram substituídos. Dentre eles, 68 cederam lugar a cônjuges ou parentes próximos e 33 comemoraram as vitórias dos substitutos.

Em um dos casos, ocorrido no interior da Bahia, o candidato deu lugar à mulher e vibrou por haver transferido quase 100% de seus votos, orgulhando-se de que a cidade passaria a ter dois prefeitos. Já a prefeita eleita, procurada pela imprensa, teria recomendado que qualquer entrevista fosse feita com o marido. 

O aumento das substituições de véspera era um dos efeitos prováveis da plena aplicação da Lei da Ficha Limpa. Ao contrário do que ocorre nas eleições proporcionais, quando as trocas somente são admitidas até 60 dias antes do pleito, nas majoritárias não há prazo para a substituição.

A brecha da lei permite que candidatos sabidamente inelegíveis, mas com grande capital político, registrem candidaturas fadadas ao indeferimento, realizem campanha, apareçam na urna e explorem seu prestígio até a undécima hora, quando são substituídos, sem que haja tempo suficiente para esclarecer ao eleitor sobre a modificação, prevenindo que seja induzido em erro.

Esta substituição de última hora tem grande potencial de ferir o valor constitucional da normalidade da eleição. A possibilidade de troca se apresenta desde o momento do indeferimento. Se o candidato e seu partido optam por recorrer da decisão, deixando de realizar prontamente a substituição, o fazem por sua conta e risco, o que deve envolver, inclusive, a possibilidade de que a modificação, se requerida na véspera do pleito, seja negada pela Justiça Eleitoral, anulando-se os votos.

 

A estratagema será defendida, por certo, sob o argumento de que caberia ao Judiciário ter decidido os recursos com antecedência e que a renúncia é um ato lícito. Disso não se duvida, todavia não parece que a Justiça deva acolher irrestritamente os pedidos, especialmente quando se possa deduzir a má-fé.

Vêm de Brasília notícias de que o Congresso Nacional alterará a lei para evitar o arrodeio que já era bastante previsível e que agora se consumou. Depois da casa arrombada, cadeado à porta.

 

Marcelo Roseno de Oliveira

marceloroseno@yahoo.com.br 

Juiz de direito e professor universitário