Momento Histórico
O príncipe regente, dom João baixou decreto em 10 de maio de 1808 criando a Casa da Suplicação do Brasil
A Justiça Brasileira comemorou ontem duzentos anos de sua criação formal, graças a transferência da Corte Portuguesa para o Brasil, em 1808, período em que a Colônia passou a sofrer profundas transformações no aspecto econômico social e também na sua organização judiciária.
O príncipe regente Dom João elevou, através de alvará, a Relação do Rio de Janeiro (espécie de tribunal de primeira instância) à condição de Casa de Suplicação do Brasil (última Instância), em 10 de maio daquele ano. O principal motivo foi a inviabilização do envio de processos para a Corte homônima em Lisboa, na época a metrópole do Reino.
A primeira organização judiciária do Brasil aconteceu ainda no início da colonização entre 1534 e 1536, quando foram concedidas as capitanias hereditárias, mediante cartas de doação e respectivos forais. Com o fracasso do sistema, D. João III determinou, em 1548, a criação de um Governo-Geral, expedindo-se quatro regimentos, destinados ao Governador-Geral, ao Provedor-Mor, ao Ouvidor-Geral e aos Provedores Parciais. Depois disso criou-se o primeiro Tribunal da Relação, na cidade de Salvador, em 1587, que depois foi transferida para o Rio de Janeiro.
A Suprema Corte Brasileira, participou, ao longo desses dois séculos, de momentos decisivos para a história do País, tendo julgado questões de relevância para a nação, como a prisão de militares que defendiam a ´Revolução Federalista´ no ano de 1893. Os acusados tiveram como advogado ninguém menos que Rui Barbosa, considerado um dos maiores juristas brasileiros da história, mas o habeas corpus em favor dos mesmos foi negado por maioria da Corte.
Dez anos depois, já sob o a denominação de Supremo Tribunal Federal, julgou o banimento da Família Real Brasileira. Processo foi movido por dom Gastão de Orleans, o Conde d"Eu, sua mulher Princesa Izabel de Orleans e demais membros da ex-dinastia brasileira de Bragança. A Corte decidiu pelo não conhecimento do pedido e a família real teve quer pedir asilo fora do País.
Nos dias atuais o Supremo tem se notabilizado pelo julgamento de políticos, como o ex-presidente Fernando Collor de Mello (hoje senador por Alagoas). Após um julgamento demorado, Collor, que sofreu impeachment em 1992, acabou inocentado da acusação de corrupção passiva em 1994.
No mais recente e rumoroso processo envolvendo políticos, o STF aceitou as denúncias contra 40 pessoas envolvidas no ´escândalo do mensalão´ (esquema de pagamento de propinas a políticos em troca de apoio ao Governo) entre eles o ex-ministro José Dirceu, o deputado José Genoíno, o secretário do PT, Silvio Pereira (que após acordo com a Justiça para se livrar do processo está prestando serviços comunitários), o publicitário Marcos Valério, entre outros.
Mas de acordo com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), entre 1988 e 2007, o STF não condenou nenhum agente político julgado pela prática de crimes contra a administração pública.
Mesmo com o processo do Mensalão em andamento, o STF anda as voltas com um novo e polêmico processo – sobre a legalidade das pesquisas com células-tronco embrionárias. O STF terá que decidir ´apenas´, onde começa a vida. Caso decida que começa com o embrião, as pesquisas poderão ser proibidas no País. O processo tem como relator o ministro Carlos Ayres Britto que espera elaborar até o final de junho o relatório sobre a ação direta de inconstitucionalidade (Adin). As pesquisas foram autorizadas no País através da Lei de Biossegurança. A ação foi proposta pela Procuradoria-Geral da República (PGR) em 2005.
MEMÓRIA NACIONAL
História é preservada em vasto arquivo
O STF tem um vasto acervo datado da época do império. Um dos processos que encontra-se digitalizado no site da Corte, consta uma apelação criminal por parte do senhor João Rodrigues Carrilho proprietário do escravo Manuel Cabina, que teria assassinado outro escravo Miguel Cabina, também pertecente a ele. Rodrigues alegou que não poderia perder dois escravos de uma vez e pediu a reconsideração da Justiça, no que foi atendido.
Em documento datado de 31 de agosto de 1870, sendo o processo mais antigo da classe de Habeas Corpus existente no arquivo do STF, é contestada a prisão ilegal do italiano Nicolla Hamillo Mattocello. Ele teria sido preso sob a tese de depositário infiel. Sobre o caso, a Corte, já sob a denominação de Supremo Tribunal de Justiça indeferiu o pedido de habeas corpus.
No dia 5 de abril de 1898, o senador e jurista Rui Barbosa impetra habeas corpus em favor do Senador João Cordeiro e outros, desterrados na Ilha de Fernando de Noronha, por crime de conspiração. Eles foram acusados de terem perpetrado um atentado contra o Presidente da República, Prudente de Morais, quando este recebia as tropas que regressavam de Canudos, onde eliminaram Antônio Conselheiro e seus seguidores. O Ministro da Guerra, ao protegê-lo, foi ferido mortalmente pelo agressor. Na época foi decretado estado de sítio. O Tribunal negou a ordem.
Em 31 de janeiro de 1905, na chamada revolta da vacina, o Dr. Pedro Tavares Junior interpõe recurso de habeas corpus em favor de Manoel Fortunato de Araújo Costa, alegando ameaça de constrangimento ilegal o fato de recebido pela segunda vez a intimação de um inspetor sanitário para adentrar em sua casa e proceder à desinfecção do mosquito causador da febre amarela. O Tribunal julgou ilegal a decisão da autoridade sanitária de entrar, até com auxílio da força pública, em casa particular. O caso ficou conhecido como ´a revolta da vacina´, realizada sob a coordenação do médico sanitarista Osvaldo Cruz.
Em 6 de4 julho de 1904, o estado de Santa Catarina entra no STF com uma ação contra o estado do Paraná, em questão sobre limites interestaduais, na chamada Região do Contestado. ´Alvarás, cartas-régias, leis e decretos do século passado, regendo a matéria de limites naquela região, e também o princípio do uti possidetis, invocado por uma das partes, são interpretados longamente pelo Tribunal, em demanda que se prorroga por vários outros julgamentos, provocando acirradas lutas, com grave repercussão social, e dificuldade na execução das sentenças´. A ação foi julgada procedente, por maioria. Santa Catarina ganhou a ação, mas o cumprimento só ocorreu em 1913.
Fase negra
Em 1936 aconteceu um dos fatos mais negros da história republicana do Brasil – o julgamento de Maria Prestes (Olga Benário). O advogado Heitor Lima pediu habeas corpus em favor dela. Presa como estrangeira perniciosa à ordem pública, a fim de ser expulsa do território nacional, o habeas corpus pedia que ela fosse julgada por crimes cometidos no Brasil, alegando gravidez da paciente. A decisão foi pelo não conhecimento do pedido. O resto da história é de conhecimento público. Olga foi entregue por Getúlio Vargas à Gestapo (polícia política de Adolph Hitler) e morta em uma câmara de gás num campo de concentração.
Trinta e um anos depois, o STF julgou a em favor da extradição do alemão Franz Paul Stangl, acusado pelo extermínio de milhares de pessoas em campos de concentração, na Segunda Guerra. Stangl dirigiu os campos de extermínio de Hartheim, na Austria e Sobibór e Treblinka, na Polônia.
JUDICIÁRIO
Supremo Tribunal Federal é o principal órgão do Poder
O Supremo Tribunal Federal é o principal órgão do Poder Judiciário Brasileiro, e a ele compete guardar a Constituição Federal. De acordo com a Constituição Brasileira, a Corte Suprema é composta por onze Ministros, brasileiros natos, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada, e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação pela maioria absoluta do Senado Federal.
Entre suas principais atribuições está a de julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a argüição de descumprimento de preceito fundamental e a extradição solicitada por Estado estrangeiro.
Na área penal, destaca-se a competência para julgar, nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República.
Conforme a Emenda Constitucional n. 45/2004, o Supremo pode aprovar, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, súmula com efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal. Isso significa que processos de igual teor julgados nas instâncias inferiores tem obrigatoriamente que seguir a decisão da corte principal do País.
Ao STF cabe ainda, em grau de recurso, julgar o habeas corpus, o mandado de segurança, o habeas data e o mandado de injunção decididos em única instância pelos Tribunais Superiores, e, em recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância. As informações são do site www.stf.gov.br.
DESDE 1989
Superior Tribunal de Justiça é mais novo membro
Além do Supremo Tribunal Federal, a Justiça Brasileira é composta por cinco modalidades – Justiça Comum, Justiça Federal, Justiça Eleitoral, Justiça do Trabalho e Justiça Militar (ver cronograma ao lado). A primeira instância é integrada por juizes do primeiro grau, que atuam nas varas e fóruns. A segunda instância é formada por desembargadores nos tribunais estaduais e juizes nas demais modalidades. Já a terceira instância conta com membros dos tribunais superiores.
O mais novo membro da Justiça Brasileira é o Superior Tribunal de Justiça (STJ) que este ano completa 19 anos de criação. Considerado até mais ágil que o STF, o STJ foi criado exatamente para desafogar a corte maior. Sua criação foi fruto de debates políticos e acadêmicos durante o século passado, culminando com sua criação pela Constituição Federal de 1988.
O STJ é descendente direto de uma outra instituição surgida há 60 anos: o Tribunal Federal de Recursos (TFR). Tal como o STJ, o TFR foi uma das grandes novidades de uma carta constitucional que surgia após um longo período de exceção democrática no país, que foi o Estado Novo. Com o fim da era Vargas (Getúlio Vargas), Eurico Dutra foi eleito presidente e uma nova Carta Magna fez-se necessária. O TFR foi incluído na nova Constituição com a missão de funcionar como segunda instância da Justiça Federal. A nova Corte foi instalada no Rio de Janeiro, em 17 de maio de 1947.
O STJ é a última instância das leis infra-constitucionais (relativas a constituição) tanto no âmbito Federal como no da estadual. Começou a funcionar em abril de 1989. No total, o Tribunal já contabiliza mais de 2,1 milhões de julgamentos ao longo de sua história. A corte é formada por 33 ministros.
Marcelo Raulino
Fonte: Diário do Nordeste 12/05/2008