artigo_dra_veronica

Labor ou Família: Uma escolha difícil – Artigo da juíza Verônica Margarida, publicado na edição do dia 17 de agosto, do jornal O Liberal, de Belém – PA.

De repente… Sete anos! O tempo passa, nem nos damos conta. Entre os lampejos da memória, esse grande museu de fotografias, na feliz expressão de Humberto de Campos, um desponta lancinante.

-Pai, estou indo.

-Vou te acompanhar até a porta.

A voz rouca e cansada, os braços rígidos, as mãos em igual desventura. Os passos lentos insistem em acompanhar os meus, inutilmente relutantes.

– Filha, até a volta.

A resposta é a de sempre, as férias vindouras aprazam o reencontro. O consolo é o labor que sacrifica o próprio ser em prol do outro. Conquanto o fardo de Têmis seja demasiado árduo, os frutos são imensuráveis. Garantir o exercício de direitos tem um inefável peso de satisfação. A solução do conflito, ao cabo de dedicadas horas à família em estado de beligerância; a ordem que refreia a injustiça dos grilhões ou lança ao claustro o autor do injusto; a tutela de urgência que alivia o jugo da angústia, nos corredores dos hospitais… lançam no espírito do julgador a íntima convicção do dever cumprido. Mais que isso. O repouso é tranquilo. Esquadrinhando a mente, o travesseiro recebe a leveza da consciência, o leito aconchega a serenidade da alma.

Memorável, o último dia 30 trouxe a lembrança de um grande dia. A posse, o juramento, a estrada solitária, porém reta e sem atalhos, a renuncia à convivência familiar por amor à magistratura, compõem um belo quadro, a estampar a escolha vocacionada, e por essa razão lastro de dores. Logo, a porta abrir-se-á outra vez, o vestíbulo natalício calçará meus pés desacompanhados. A voz paterna já não a ouço mais…

Mas em breve cruzarei a estrada de volta para casa. E não estarei só. Outros sorrisos florescerão em pleno estado de felicidade. O de minha família, e de centenas de outras famílias que logo estarão reunidas.

Num cenário de mudanças, de quebra de paradigmas e afirmação de direitos, o Conselho Nacional de Justiça dará um importante passo no reconhecimento da permuta entre magistrados estaduais. Doravante, Juízes do norte ao sul poderão exercer suas funções em seu Estado natal. Não haverá prejuízo algum à sociedade. Pelo contrário, os ganhos são inestimáveis. A permuta agrega valor à prestação jurisdicional, na medida em que prestigia a pessoa do magistrado. A toga não veste máquina. Por trás da mesa de conflitos há um cabedal de anseios, sentimentos, valores, direitos. Sim, quem cuida também deve ser cuidado, valorizado, precipuamente num campo tão caro e salutar ao ser humano: A família.

Verônica Margarida Costa de Moraes
Juíza de Direito Titular da 2ª Vara da Comarca de Baturité/Ce
[email protected]