Magistrados cearenses encabeçam ações multidisciplinares de combate à violência doméstica e abuso sexual

O ano de 2017 foi certamente de destaque para o combate à violência contra a mulher. Projetos considerados inovadores foram iniciados, ganharam visibilidade e serão expandidos em 2018. Estas ações agem em diversos aspectos críticos visando a mitigação do problema: no incentivo e facilitação à denúncia, no apoio às vítimas e acompanhamento dos agressores para sua conscientização e ressocialização.

Em Maracanaú, Região Metropolitana de Fortaleza, o projeto “Paz no Lar” leva, duas vezes por semana, equipes da Justiça para visitas na casa das vítimas de violência doméstica. O objetivo é verificar se a medida protetiva definidas em juízo tem sido cumprida, além de colher elementos para os processos acompanhados e aproximar o Poder Judiciário das vítimas. Duas vezes por mês, o próprio juiz da vara local vai até a casa da vítima.

Atualmente, o projeto conta com mais de 600 famílias beneficiadas. As equipes são formadas por assistente social e servidores da Justiça, Guarda Municipal, polícias Civil e Militar.“É uma cultura machista de coisificação da mulher. A mulher se sente uma propriedade do agressor. Quando entra alguma medida judicial, há uma inversão na cabeça da mulher, de vítima, ela passa a se sentir culpada por colocar o pai do filho na cadeia. Ela precisa entender que é vítima”, argumenta o juiz de Maracanaú, César Morel Alcântara.

Outra abordagem é o encaminhamento dos agressores aos Centros de Referência de Assistência Social (Cras) e Centros de Referência Especializado de Assistência Social (Creas). Segundo Morel, as duas maiores causas de violência doméstica são o uso excessivo de álcool e drogas.

Em Quixadá, na Região Central do Estado, um projeto considerado pioneiro, também atua com foco no acompanhamento dos agressores. Por entender a violência uma questão social, a Juíza da 2ª Vara da Justiça da Comarca de Quixadá, Ana Cláudia Gomes de Melo, passou a desenvolver uma nova dinâmica no combate à violência de gênero. Os agressores estão participando de um grupo de apoio e recebendo tratamento psicológico.

A participação nas reuniões é obrigatória, por meio de medida judicial, e atua em questões como o respeito à história do outro, expressão e manifestação das emoções, as dificuldades em razão da forma como foram educados, resgate da história de vida de cada um, questões de gênero, paternidade, cuidado com os filhos, alternativas para o controle pessoal e resolução de novos conflitos sem o uso da violência. Caso o agressor falte, ele deve participar de duas reuniões adicionais.

Na mesma cidade, ações que visam à conscientização da população em geral sobre o combate à violência doméstica, incluindo esclarecimentos sobre a Lei Maria da Penha. “Conseguimos fazer parcerias com várias agremiações da sociedade civil para trazer o maior número de mulheres possível. O objetivo foi aliar a prestação de serviços e o esclarecimento à população. Temos índices altíssimos de crimes ligados à violência doméstica na cidade de Quixadá e queremos quebrar esse ciclo”, explicou Ana Cláudia.

Aplicativo
Desde novembro do ano passado, mulheres que estão sob medida protetiva, contam com recurso de poder acionar a polícia, em caso de violência doméstica, sem precisar passar por telefonista.

Diante de situação real de perigo, ela pode pressionar o “botão do pânico” por três segundos (tempo necessário para não ser acionado por um descuido). Com isso, o pedido de socorro é enviado à Ciops. A ferramenta foi criada pelo Governo do Estado, em parceria com o Judiciário.

O projeto piloto iniciou em alguns bairros de Fortaleza, mas a previsão é ampliar o serviço para toda a capital cearense. Os dados serão sigilosos e de conhecimento apenas da Polícia. Além disso, o aplicativo avisa se não houver conexão com a central e se o GPS estiver desativado, solicitando a ativação por parte da usuária.

Abuso sexual em locais públicos
Em dezembro, o Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, juntamente com o Governo Estadual, a Prefeitura de Fortaleza, a Associação Cearense de Magistrados (ACM) e entidades da sociedade civil, lançaram a Campanha Contra o Abuso Sexual de Mulheres.

A ação tem ênfase no transporte coletivo, com mensagens que alertam para a importância da denúncia e provocam o debate na sociedade. Além disso, outros nichos sociais também são abordados, como escolas, universidades, mídia e sociedade civil organizada em geral.

Dignidade Feminina
Para o presidente da Associação Cearense dos Magistrados, Ricardo Alexandre, as ações realizadas em várias frentes impulsionam o enfrentamento de crimes contra a dignidade feminina. “Punir os crimes é uma das ações indispensáveis, mas se quisermos ter um resultado que busque diminuir as ocorrências como um todo, devemos atuar em todos os setores da sociedade. É com essa visão que os magistrados estão idealizando ações e buscando parcerias na sociedade civil para reunir todos os esforços necessários”, reflete o presidente da instituição.