20140227_OE_A segurança institucional está tornando-se insuportávelDIREITO & JUSTIÇA

“A insegurança institucional está tornando-se insuportável”

No último 31 de janeiro, o juiz Antônio Alves de Araújo tomou posse como novo presidente da Associação Cearense de Magistrados (ACM) para o biênio de 2014 a 2016. Natural de Jaguaribe (CE), o magistrado formou-se em direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC), logo após exerceu, por 12 anos, a função de delegado da Polícia Civil.

Ingressou na magistratura, em 1993, ao classificar-se em concurso público para juiz de Direito. Desde então, passou pelas comarcas de Aiuaba, Várzea Alegre, Icó, Quixerambim e, em Fortaleza, atuou nas Varas Cível e de Família. Em 2012, assumiu a vice-presidência da ACM e este ano, por obter 260 votos, em novembro do ano passado, foi conduzido a liderar a presidência da entidade.

Em entrevista ao caderno Direito & Justiça, do jornal O Estado, Antônio Araújo fala sobre os prejuízos com o déficit de 107 juízes e 238 servidores no Estado do Ceará, bem como a insegurança nas comarcas tanto para a população como segurança pessoal dos magistrados. Ele garante, ainda, que uma de suas prioridades é, também, a defesa da proposta de estabelecer as eleições diretas nos tribunais.
[Direito & Justiça]: Os magistrados cearenses realizaram mobilização, no dia 13 de fevereiro, no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE), com o objetivo de sensibilizar os desembargadores sobre a carência de 107 juízes e 238 servidores. Já houve alguma resposta?

[Antônio Araújo]: Essa mobilização foi não só para deficiência de magistrados e servidores, mas existem outros problemas como a questão da insegurança institucional e falta de estrutura física de alguns fóruns no Estado. Isso ao longo de algum tempo vem se agravando e, hoje, tornou-se insuportável. Na verdade, temos dois concursos anunciados, um para servidores e outro para juízes, acontece que os servidores deverão ser contratados, após a realização do concurso, no início do segundo semestre, e os juízes no final do primeiro semestre do próximo ano. Logo, nós vamos ter, ainda, um ano e meio convivendo com esta dificuldade. Ressaltando, também, ainda que vamos ter o período eleitoral, portanto. Todo o segundo semestre desse ano, os juízes eleitorais ficarão com prioridade para essa matéria, e a Justiça Comum vai, realmente, ser muitíssima penalizada.

[D&J]: O que esse déficit representa para a sociedade?

[AA]: Representa um prejuízo incalculável, porque as demandas judiciais, você sabe que quando se ingressa na Justiça é porque está precisando, se está carente e até como último meio que o cidadão tem ao seu dispor. Não se entra na Justiça por deleite, e funcionando, precariamente, o cidadão terá os seus direitos retardados, até não podendo mais ser revestidos.

[D&J]: Quanto à questão da insegurança nos fóruns, como o senhor avalia?

[AA]: Isso é uma questão grave. Como se sabe a segurança pública hoje está, na verdade, em situação caótica, logo, os operadores do Direito como um todo e a própria população, que procura e se aglomera nos fóruns à procura de Justiça, vê-se ameaçada por pessoas que invadem os fóruns. Ano passado aconteceu com certa frequência, para obter, sobretudo, drogas e armas. Juízes e promotores foram ameaçados nas Comarcas de Guaraciaba do Norte, Iracema e Limoeiro do Norte, onde uma parte procurava um juiz e outra parte procurava agredir um certo desafeto, que por coincidência, estava prestando depoimento perante a juíza e o promotor público. Os fóruns precisam de segurança armada. Não só de equipamentos de segurança, como o Tribunal já está providenciando portais eletrônicos e detectores de metais, mas também de pessoas para operar tais equipamentos e também impedir que alguém chegue armado e entre no interior do fórum. Fica muito ruim, porque a casa que distribui a justiça, a casa que garante a segurança à sociedade, proteção à coletividade, uma vez sem ter a própria segurança fica muito difícil para se trabalhar.

[D&J]: É muito comum que os magistrados sofram ameaças. Que tipos de medidas protetivas eles têm direito para resguardarem-se?

[AA]: No caso concreto, quando ocorre a ameaça, o Tribunal tem dado segurança àquele magistrado durante algum período. Mas precisamos de segurança permanente. Já existem injuções da Associação no sentido de que os juízes possam adquirir e o próprio Tribunal tenha carros blindados para que esses juízes que estão ameaçados possam deslocar-se, realizarem suas atividades sem nenhum temor e que possam dar a efetividade ao estado democrático de direito e garantia à sociedade como um todo.

[D&J]: Mas, infelizmente, essas ameaças são um risco da profissão?

[AA]: Claro, toda profissão tem riscos, mas nós temos que adquirir meios para que esses riscos não se efetivem, porque o juiz exerce uma profissão de risco. Ele precisa, na verdade, de segurança e quem tem que dar a segurança é o próprio Estado, o próprio Tribunal, mas o Estado como um todo. Um juiz não pode contratar às suas expensas, guarda-costas, isso não seria legal. Quem tem que dar proteção ao juiz é o próprio Estado ao qual ele serve, para o qual ele trabalha e do qual ele é empregado.

[D&J]: Umas das questões mais discutidas na gestão anterior à do senhor, na ACM, foram as eleições diretas nos tribunais. O senhor pretende levar essa pauta adiante, algum trabalho já está sendo desenvolvido?

[AA]: Não só pretendo como também devo estimular e alavancar essa questão. Eu disse, no meu discurso de posse, que essa é a bandeira número um da nossa gestão, seria a das eleições diretas. Por que eleições diretas? Porque com a democratização interna do Poder Judiciário, nós, juízes do primeiro grau, como um todo, podemos participar do planejamento estratégico dos tribunais. Podemos opinar na distribuição dos recursos de modo que a justiça do primeiro grau que é a Justiça que está em contato com o povo no dia a dia e conhece as dificuldades da população e na verdade é quem soluciona as questões primeiras da sociedade, possa esse juiz, realmente, ter dotações orçamentárias e influir na administração do Tribunal de modo a que se aproxime mais dos interesses da população.

[D&J]: Quais outras questões o senhor acha que precisa dar mais ênfase nessa gestão?

[AA]: Na verdade, se todas essas questões forem resolvidas, por exemplo, a eleição direta e a distribuição proporcional dos recursos, atendendo melhor ao primeiro grau, que é o que está mais próximo à população, de modo, a que de forma mais adequada, estabeleça diretrizes de trabalho e que se tragam condições para os juízes, e que se dotem todas as comarcas de servidores, estaremos bem encaminhados.

[D&J]: Temos visto muito a inserção de mulheres no Judiciário. Como o senhor vê esse destaque?

[AA]: Vejo como uma tendência natural, salutar, até porque a mulher precisa ser inserida na sociedade em todos os seus setores, não só na magistratura, no Ministério Público ou na política, mas em igualdade com o homem, à mulher não é um ente de segunda categoria. É de primeira categoria tal qual o homem, então ela pode, e sem nenhum problema, participar e deve participar de todos os meios produtivos e também em todas as esferas de governo e em todas as áreas de poder. Até devo dizer que se não fosse a mulher, não havia nem o homem.

 

Fonte: O Estado