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Uma nova missão, um novo compromisso
30/08/2014

Cícero, orador romano, defendeu, em um discurso sobre o Direito Natural, que não se podia negar aos homens aquilo que não se negava aos bichos: o tratamento compatível com a integridade física e com as necessidades básicas da existência. Ao preso, pelo fato de estar pagando por seus erros, não se pode humilhar e degradar, negando-lhe a dignidade de sua condição humana.

Dessa forma, quando, juíza da 2ª Vara de Execuções Penais, fui designada, em fevereiro deste ano, para exercer a Corregedoria dos Presídios e Estabelecimentos Penitenciários da Comarca de Fortaleza, pensei em contribuir para que esse discurso se tornasse realidade. O mandato, que será de um ano, envolve a inspeção das unidades prisionais , verificando a situação dos presos e zelando não apenas pelo correto cumprimento das penas, mas também das medidas de segurança, das condições de tratamento humano e de projetos de ressocialização.

Assim, em parceria com movimentos humanitários, decidiu-se pela criação e instalação do Conselho da Comunidade, um instrumento social de grande importância porque, ao mostrar para os seus membros o funcionamento interno dos presídios, desnuda para a sociedade civil a realidade do sistema. Com o conhecimento do que se passa entre os muros das cadeias socializado entre os representantes de diversos segmentos sociais, esperamos que se gere o debate entre formadores de opinião, grupos sensibilizados e autoridades e, a partir desse impacto, surjam iniciativas que, sem prejuízo para o cumprimento das sentenças judiciais, colaborem para a reinserção dos presos na sociedade.

Dentro dessa linha de atuação, buscamos colaborar para evitar afrontas aos direitos humanos como, por exemplo, a revista íntima manual dos visitantes dos presídios, incluindo a sua nudez. Para tanto, determinamos através de portaria publicada no Diário de Justiça, que a revista só poderá ser feita por meio de equipamentos eletrônicos, como detectores de metais, raios X, bodyscanners ou similares. Felizmente, o Estado já está providenciando todos os instrumentos necessários e instalando esses recursos técnicos, o que coloca o Ceará em uma posição de civilidade em relação ao tema.

No desempenho da nova missão, experimento mais uma vez a sensação da imensa responsabilidade de encarnar aquilo que os romanos chamavam de res publica, a coisa pública. No meu caso, um mosaico apenas, uma pequena fatia da missão republicana do Estado, que quero desempenhar com humildade, transparência, acuidade e determinação.

Luciana Teixeira de Souza
[email protected]
Juíza titular da Corregedoria dos Presídios

Fonte: O Povo