ARTIGO
09/06/2014
Interrogatório no processo penal

A reforma do Processo Penal introduzida pela Lei n. 11.719, de 2008, incluiu nova redação para o art. 400, estabelecendo que o acusado será interrogado sempre depois das declarações do ofendido, da inquirição das testemunhas arroladas pela acusação e pela defesa, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao reconhecimento de pessoas e coisas. Mas é preciso esclarecer pontos centrais do tema considerado pela doutrina, uma vez que ela diverge sobre à natureza jurídica do interrogatório. Assim, há corrente de doutrinadores que consideram o interrogatório como meio de defesa. Para outros, meio de prova, e, para uma terceira corrente, tem esse ato processual característica híbrida, pois é, ao mesmo tempo, meio de prova e meio de defesa e, por fim, uma quarta corrente, sustenta que o interrogatório é considerado meio de defesa, primordialmente, e como meio de prova, de forma subsidiária.

Pois bem. Ninguém discorda que quem é acusado em processo penal tem o direito fundamental de ser ouvido perante a autoridade judiciária competente. E o interrogatório é considerado ato personalíssimo do acusado porque este não pode ser substituído nesse ato processual por ninguém, nem por procurador com poderes especiais conferidos para desempenhar esta missão. É preciso ainda esclarecer que o acusado, no interrogatório, pode calar ou até mesmo mentir. Não pode ser exigido do acusado que fale a verdade. Mas também pode confessar. O Pacto de San José da Costa Rica afirma que a confissão do acusado só é válida se feita sem coação de nenhuma natureza.

Sendo assim, considerando ser o interrogatório um ato inalienável do acusado, deve ser dado a ele a faculdade de escolher o momento próprio de ser prestado. Cabe dizer: erra o juiz que não consulta o acusado sobre o momento em que quer ser interrogado. O direito fundamental tem índole constitucional, portanto, com força normativa maior do que a lei ordinária. Com isso, entendo que o acusado pode pedir ao juiz para ser interrogado no início do processo, mormente quando quer apresentar logo sua confissão. Neste caso, cabe ao promotor levar ao processo outras provas para confirmar os fatos confessados, a fim de evitar a assunção do crime por outrem para garantir impunidade, não incomum nos meios forenses. O acusado é o principal protagonista do processo penal porque é ele que vai suportar o peso da decisão. Nenhuma lei deveria sufocar um direito constitucional do acusado.

Michel Pinheiro

Juiz do Tribunal do Júri em Caucaia

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Fonte: O Povo