Dando como exemplo os arrozeiros e tribos indígenas de Roraima que assistiram no dia anterior (27/08), ao vivo, nos rincões da selva amazônica, à transmissão da TV-Justiça da deliberação do Supremo Tribunal Federal sobre a demarcação da Terra Indígena Raposa Serra do Sol, o juiz Marcelo Roseno deu início ao segundo dia de palestras do I Seminário Mídia e Judiciário, encerrado ontem. O titular da 3ª. Vara de Sobral, que é também vice-presidente da Associação Cearense de Magistrados (ACM) debateu com o jornalista Gualter George, editor de Política do jornal O Povo, o tema “Desafios da cobertura” – O cotidiano dos temas jurídicos nas redações”.

A partir da existência da Loman (Lei Orgânica da Magistratura), e seguindo rigidamente os  seus ditames, o Judiciário adotou por muitos anos uma postura extremamente cautelosa e discreta em relação à divulgação de suas ações, definiu o juiz Roseno. “Mas, ao dar  as costas ao sentimento das ruas, corria também o risco de ver a população dar as costas ao próprio Judiciário, e resolveu mudar de atitude perante a mídia e a sociedade”, diagnosticou. O que o juiz observa com satisfação no momento é um Judiciário abrindo as suas portas para uma nova transparência, numa atitude que classifica de certo modo, “sair de um extremo  para o outro”, sendo, a seu ver, desejável até um certo equilíbrio, porque “já há muitos membros do Judiciário que ´adoram` a mídia, o que também não está correto”, ponderou.

Roseno participa da convicção de que deve ser buscada uma maior permeabilidade do Judiciário com o jornalismo e vê com otimismo as mudanças que estão acontecendo com um poder que sempre se pautou pela solenidade e o tradicionalismo. Uma das alavancas dessas mudanças foi, no seu entender, a criação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que relativizou em grande parte a auto-suficiência e a soberba de um poder que agora é também fiscalizado e presta conta, regularmente, de suas posições perante a opinião pública.

Apontou como sinais desses novos tempos na Justiça brasileira, a lei contra o nepotismo, a obrigatoriedade da promoção dos magistrados se  realizar de forma aberta e justificada em plenário e a publicação anual do Relatório, onde a Justiça aparece de corpo inteiro, em números, com os resultados concretos de seus trabalhos: sentenças proferidas, audiências concedidas etc. “O Judiciário despertou, embora tarde, que não pode se distanciar dos  ideais  republicanos e que os seus membros não passam de servidores do Estado, pagos com os tributos arrecadados do povo”. Em conseqüência, tem que estreitar a relação com a mídia, como forma desse diálogo com a sociedade, começando pela simplificação de sua linguagem, para facilitar a compreensão dos profissionais de imprensa. Roseno vê com bons olhos a possível adoção de noções da disciplina jurídica nos cursos de jornalismo ou, no mínimo, a intensificação de iniciativas como este seminário, encerrado ontem.

Ao final da palestra, o editor de Política do jornal O Povo, Gualter George fez suas ponderações, começando por admitir um dos principais motivos a atrapalhar o trabalho dos jornalistas com a Justiça é “a ignorância e a arrogância” dos homens de imprensa. Gualter defende bastante a humildade profissional, principalmente ao lidar-se com áreas delicadas como a máquina judiciária:”A gente não pode ter certeza de nada. É preciso perguntar sempre”, resumiu. Recomendou bastante cautela aos seus colegas nessa tentativa de tornar “mais palatável” as informações de caráter técnico, e muitas vezes sigiloso, que transitam entre os tribunais e as redações, dando como receita de trabalho para a mídia “traduzir o juridiquês para o leitor, mas sem deformar a informação”.

Na segunda palestra da noite, o juiz eleitoral  Emanual Leite Albuquerque, do Tribunal Regional Eleitoral da 7ª. Região, fez uma rápida exposição sobre “O que pode e o que não pode na propaganda eleitoral”, à luz da legislação vigente, esclarecendo dúvidas sobre as próximas eleições municipais.